"Na Rua passa um operário. Como vai firme!". Sobe ao ônibus junto comigo e senta no banco perto do motorista. Seus sapatos são sujos de terra, sua barba é mal feita, sua camiseta está rasgada. "Para onde vai o operário? Teria vergonha de chamá-lo meu irmão." É apenas um homem comum. Eu passo de mochila nas costas, caderno na mão e ele diz. "Está voltando da faculdade, filho? Vai bem nos estudos?". Eu respondo que sim, que vou bem, graças a deus. Ele sabe que não os entenderemos nunca. Responde a mim: "Eu também, garaças a deus me formei engenheiro, hoje eu só comando". O operário não se banhou ao mar, nunca se banhará. Prometeram-lhe o futuro e depois o estapearam. Por isso ele nos despreza, por isso decidiu-se ser outra pessoa. "Não ouve, na Câmara dos deputados, o líder oposicionista vociferando". Está desiludido, só lhe resta a mentira. Dou um sorriso a ele, e não falo mais nada. Pago minha passagem e sento-me no banco. "Único e precário agente de ligação entre nós, seu sorrisocada vez mais frio."
Chega a hora de descer, ele usa o cartão eletrônico para pagar a passagem. Não há crédito. Ele diz ao cobrador: "eu acabei de recarregar 49 reais aqui". O cobrador argumenta que não há dinheiro nenhum no cartão. Ele diz que foi engando. Ele diz que foi enganado!. E foi. Diz: "Terei que descer aqui mesmo então, e vou ter que voltar no posto para reclamar." Desce no ponto que havia de descer o operário, na ilusão que nunca o levou ao mar.
isso foi inspirado num acontecimento de hj e num poema, "o operário no mar" de carlos drummond de andrade. Lógico que no poema, há um sentido diferente para o operário, típico da época em que le foi escrito. Eu aqui tentei moldar um outro, sem deixar de reconhecer uma das percepções de drummond: a de que por mais que especulemos sobre o operário, nunca iremos entendê-lo.
Sunday, July 02, 2006
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