Thursday, September 27, 2007

Choque de Culturas

Creio que por ser Brasileiro, e. portanto. selvagem, eu não sou capaz de entender alguns dos raciocínios do mundo civilizado. Examinando um desses documentos do Banco Bundial, sobre o "Civil Service" no mundo, li uma passagem que demorei trinta minutos para achar alguma lógica. A passagem falava de como prevenir que cargos públicos de indicação política (cargos em comissão, para nós aqui no Brasil) se tornassem um instrumento de patronato, de um Estado Patrimonial, em vez de serem para o bem do estado Burocrático. Eis a passagem:

"Little is known about how individual politicians are constrained to ensure that pure political appointments serve overall government objectives. One interesting example is Sweden where political appointees are guaranteed salaries for 2 years after dismissal. Norwegian political appointees are treated similarly, although the guaranteed allowance continues only for 2 or 3 months. the effect of these arrangements is to prevent any ministerial appointemnt from being interpreted as a purely personage patronage position"

(???) Bom, a única lógica que encontrei, foi que o indivíduo indicado não teria rabo preso, por ter os salários garantidos por tanto tempo. Mas imaginem no Brasil a farra que não seria?

Definitivamente o Banco Mundial não conhece o que é um Estado Patrimonial. Nós, selvagens, sim.

Friday, September 21, 2007

O homem sem eco (inc)

O homem sem eco
pelos becos, sozinho
com dor no peito
gritava, gritava alto

nem ele escutava seu próprio grito
os vizinhos não reclamavam
os policiais não ouviam

o homem sem eco
morreu de quê?
morreu de opaco
ele não vê
não ouve. Não houve.

não causou desgosto
não deixou herança, mulheres, filhos
não tinha seu próprio endocrinologista
ou gerente de sua conta bancária

este homem, único homem absoluto da história, passou
e o mundo autista não viu

Thursday, September 20, 2007

CPMF e EU.

A CPMF não tem nada a ver comigo. Nunca usarei camisetas contra impostos, disto tenho certeza. Aliás, ouso dizer que nunca usarei uma camiseta para levantar qualquer bandeira. Para isto existem as bandeiras.
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Bem, desculpem ir logo começando a falar de assuntos pesados, mas precisava desabafar. Já já mudo de assunto.

Uso as madrugadas para ler o que tenho que ler. Não as coisas da faculdade, porque isso eu faço de manhã, quando acordo, já que estudo a tarde e à noite (faço uma jornada de 10 horas). De madrugada eu leio aquilo que eu defini que teria que ler algum dia. Muito das coisas que faço são assim, tenho percebido. Simplesmente defini que teriam que ser feitas. É uma espécie de teimosia mais rara.

Então leio esses livros, uns mais leves, como esses clássicos da literatura, e uns mais pesados, como esses clássicos da filosofia etc. É meu momento só, não que seja o único, pois estou sempre andando por aí, só. Mas quando ando por aí estou só, mas com gente à minha volta. Gosto de ficar sozinho porque a mim sei que agüento, e que às vezes sou do meu agrado.

O problema de ler de madrugada, é que não se dorme bem depois, as palavras ficam passeando pelo cérebro durante o sono. E os raciocínios maquinando. Quando acordo, parece que fiquei o dia inteiro em conflito de idéias, num debate caloroso. Então fico deitado, acordado na cama, um tempo tentando descansar, olhando para o teto. Tento pensar em mulheres simpáticas, cumprimentando-me, sorrindo. Mulheres que conheço, e as que desejo rever um dia. Lembro das que magoei, das que me desculpei, das que não me perdoaram, das que, por ser jovem demais naquela época, acho que esqueci de beijar. Mas a vida continua, por isso elas sorriem. Aos poucos as idéias vão tomando outra forma. Quando levanto da cama, estou em equilíbrio, um tanto reflexivo, um tanto emocional.

Tentei já parar de ler de madrugada, pois isto me tirava algumas horas de sono, e me deixava agitado. Mas aí vi que não teria outra hora para ler o que teria que ler. Eu passo um tempo aprendendo coisas, como uma fuga, e eu também aprendo coisas para garantir que eu seja ouvido, que eu não fique só.

Nada dessas coisas funcionam.
Hoje tento, em vez de ler, escrever, e sei que também não irá funcionar. Amanhã é outro dia, e a vida continua. Acordarei do mesmo jeito, como quem emerge de um debate ideal.

Sunday, September 16, 2007

Sobre estar na contramão

"Mas todas suas iras são de Amor;
Todos os seus males são um bem,
Que eu por todo outro bem não trocaria."


É sempre bom relembrar o velho Camões. Os sonetos são a forma poética mais lógica e racional, portanto, um bom soneto de amor é sempre estranho (no bom sentido de estranheza) para quem lê. É Estranho, mas ainda assim muito melhor que os poemas do romantismo, que são sofríveis. Difícil achar um bom. Mesmo gostando de Álvares de Azevedo, por várias vezes durmi no meio de seus poemas falando de virgens dormindo de seio nu.

Hoje, nos livramos do romantismo, mas esquecemos que o amor sem ser romântico ainda pode ser amor. E que o romantismo, quando tiramos as virgens dormindo de seio nu, não é nada importante, mas um acessório que torna a vida mais bonita.

Aceitar o amor e a paixão pelo outro como uma parte da vida, e algo a se buscar, e até a se priorizar, não trocar por nada, e um elemento indispensável para a obtenção do belo, é como estar na contramão do que se diz por aí. Os jovens, quando muito, aceitam às pressas, mas logo abandonam essa idéia, quando sofrem por isso e etc, depois dizem-se maduros. Ao contrário, creio que a maturidade é atingida apenas quando os indivíduos percebem essa escolha de forma lúcida, duradoura e serena, apesar dos contratempos.

Saturday, September 15, 2007

Educação - Inclusp

Muitos acham maravilhoso o programa de inclusão social da USP, o INCLUSP. O aluno de escola pública tem preferência na contagem de pontos (3% a mais) em relação aos alunos de escolas privadas, no vestibular da FUVEST. O argumento todo gira em torno do fato de que, bem, os alunos de escola pública são pertencentes a camadas menos favorecidas da população. É uma política pública de discriminação positiva. Eu, particularmente, sou a favor dessas políticas, tanto de cotas universitárias para negros, se quisermos combater o problema do racismo (situação de fato), como de cotas para alunos de baixa renda, se quisermos combater a desigualdade social.

Entretanto, o Inclusp fica no meio do caminho. Nem toda escola privada é o Santa Cruz, Bandeirantes e Rio Branco. Nem toda escola pública é uma escola estadual em Parelheiros. Há escolas privadas em que a mensalidade é de R$50,00, e que recebem alunos tão menos favorecidos quanto as escolas públicas ruins. Há escolas públicas, como a escola técnica Federal do Maranhão, que o filho do governador estuda, e o filho do juiz, etc.

Regime de propriedade de escolas não é critério algum. O que a USP pode estar fazendo, consciente ou não, é selecionando os melhores alunos das escolas públicas que se equiparam em qualidade à boas escolas privadas, e deixando o aluno pobre, com menos oportunidades, de escola pública, e o pobre de escola privada, sem qualquer benefício. Isto não é política de inclusão social, por mais que digam que é.

Renan Calheiros

Não sei dizer se o governo fez o cálculo político correto. Ao que parece, ele fez. Ao apoiar Renan Calheiros, pode ter conseguido uma fidelidade importante do PMDB, e do presidente do senado, que não é pouca coisa. No entanto há a questão da oposição e a prorrogação da CPMF, que poderia se acalmar caso o governo consiga com que Calheiros peça afastamento temporário.

No entanto, no jogo político democrático, a grande burrice é desprezar o componente eleitoral de tudo isso. Se a população julgar este ato ilegítimo, provavelmente alguns senadores podem começar a temer por sua reeleição em 2010. A prova de que o Brasil está mudando não estaria na condenação política de Calheiros, como muitos pensam. Ao contrário, esta mudança só será de fato mudança quando vier da própria população, mais concretamente pelo voto ou algo parecido, de forma que o político reflita previamente sobre este risco no seu cálculo político (de permanência no sistema).

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Wednesday, September 12, 2007

Tim Maia - Do Leme ao Pontal



"quem não dança segura a criança"...

A simpatia

A grande maioria das pessoas é difícil de simpatizar. E eu nem quero ser misantropo, sempre sou simpático, dou risadas. Mas há dessas vezes em que olhamos para o que uma pessoa está falando e achamos idiota. Não sei. Algumas coisas irritam mesmo. Irritam-me essas coisas que as pessoas sempre falam, como se elas estivessem falando no piloto automático, o small talk medíocre. Irrita-me porque aquele indivíduo fala alguma coisa e e me faz pensar que qualquer outro indivíduo que estivesse no seu lugar falando a mesma coisa não mudaria em nada aquela situação.

Eu não pressuponho que os seres humanos sejam únicos, ou que eles não sejam normais. Nem gostaria que cada um falasse de um jeito. Gostaria apenas que as situações fossem específicas, próprias a cada contexto, e aí não acharia que estou perdendo tanto tempo em viver.

O sentimento de que não há contexto para os acontecimentos me irrita profundamente. E conversar com qualquer pessoa hoje, conhecê-las, é pairar sobre o vago, o não-específico, sobre o qualquer. Logo passo a odiá-las secretamente, embora mantenha sempre guardado este ódio viral.

Friday, September 07, 2007

desequilíbrios (incompleto)

Ainda sinto minha pausa na natação
sinto que meus braços estão atrofiando
e junto com eles minha disposição
e um descompasso, posto que muito ando
entre a força das minhas pernas e de meus braços

Eu sei que deve-se fazer exercícios
Vejo isto nos programas de televisão,
que me exortam também a outros vícios
que me exortam a reciclar e a ouvir minha família
Um dia, que eu estiver em paz comigo
Farei tudo como mandam
Enquanto isso, mantenho-me (de pé, masnão muito firme) sem abrigo

Tuesday, September 04, 2007

Comerciais



A partir dos comerciais, é possível fazer análises sociológicas interessantes. É comum a alusão, nos comerciais brasileiros, a produtos que são "de primeiro mundo", ou seja, que têm a qualidade dos produtos das grandes nações industriais. Celso Furtado diz, entre outras coisas, que os consumidores brasileiros de alta renda procuram imitar o que se consome no primeiro mundo, e por isso forçam a criação de uma indústria de capital intensivo com dificuldades de competição externa. No Brasil temos esta obsessão pelo desenvolvimento, talvez em razão da grande promessa que éramos, e ainda somos, mas que não decolou, haja visto a crise da dívida externa nos anos 80 dos países subdesenvolvidos e o desequilíbrio e estagnação total de nosso sistema econômico.

Um dia tomaremos um café solúvel decente. Fim da reflexão.
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Meu pai fazia esses comerciais no tempo da minha infância. Ele aparece nesse, em que diz a frase final, vestido de piloto de avião. Olhando a atuação impecável, dá para entender de onde tirei todo este apelo imagético.

Thursday, August 30, 2007

Cidadezinha Qualquer

"Casas entre bananeiras
mulheres entre laranjeiras
pomar amor cantar.

Um homem vai devagar.
Um cachorro vai devagar.
Um burro vai devagar.
Devagar... as janelas olham.

Êta vida besta, meu Deus." C.Drummond de Andrade


Brasas entre edifícios
Mulheres sem nem um pingo de mulheres
Ninguém a no amor pensar

Um cachorro vai vestido,
Um homem despossuído,
Um burro na TV a cantar.
Olhar... as janelas não têm tempo!

Êta vida besta

Friday, August 24, 2007

quando nasci

impossível alguém se auto-enganar por tanto tempo.
eu, que sou mais imbecil que a média, tenho também meus momentos em que abro os olhos.
o que não dá, não dá, e está feito.
o que nunca vai ser, nunca vai ser.
resta a resignação.

e ainda que eu não seja lá muito afeito às resignações, tenho-a sempre comigo em meu bolso.

e pensar que eu aceitei participar deste mundo, quando nasci, de gente que nem sente direito as coisas, que não sente intensamente, e que não enfia nunca a cabeça nas coisas, para quebrá-la...
às vezes surge uma vontade de rir disso, mas ela logo passa.

Thursday, August 23, 2007

mensagens do lixo.

Voava um folheto pelo chão que dizia que todo o tipo de sofrimento era de alguma forma padronizado. E que se podiam observar as mesmas características nos vários seres humanos. Pisei nele.

É, de fato, um golpe duro na nossa pretensão de que somos tão únicos que o peso do mundo só pesa em nossas costas, como em ninguém mais.

Sendo o sofrimento algo padronizado, como são os produtos que vemos nas gôndolas dos supermercados, é possível que nós escolhamos nos consumir nele ou não. Há uma margem. Nesta margem está a danação da (minha) vida, pobre diabo que sou.

Quando eu vi...


"quando eu vi
que o Largo dos Aflitos
não era bastante largo
pra caber minha aflição,
eu fui morar na Estação da Luz,
porque estava tudo escuro
dentro do meu coração"

Bom e velho Tom Zé.

Tuesday, August 21, 2007

O Segredo

Passei a ter, depois de assistir uns programas de TV que me informavam sobre "o segredo", uma dúvida cruel: Será que, se eu mentalizar tudo de ruim, mas mentalizar que a tal da "lei de atração" não vai acontecer, posso me safar dos pensamentos negativos?

Sim, porque é uma decorrência lógica do raciocínio deles. Se eu imaginar que "o segredo" não funciona, se eles estiverem certos, ele terá de não funcionar necessariamente. Assim anulo meu pessimismo, meu derrotismo, e eles ficam com cara de bobos.

Nenhum livro de auto-ajuda sobrevive a um teste lógico feito sob medida.

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Como é boa a vida quando assistimos o canal E!, e vemos também aquelas pessoas curtindo a vida loucamente. Dá até vontade de ser assim também. Mas como só de ver já fico satisfeito, e embreagado de tanta diversão, e de iates, volto imediatamente aos afazeres da vida chata, que ainda é mais legal que assistir E!.

Saturday, August 11, 2007

escassez

Falta muito
Ainda falta muito para o eu
Espero que haja suficiente perdão na natureza

O sabor da vida

O sabor da vida fica nas pequenas coisas. Mentira. Embora o sabor resida na triviialidade da vida, nos seu aspectos comuns a todos os seres humanos, o trivial precisa do grande.

A vida se mede em quilômetros, em décadas, em oceanos percorridos, em monstros mortos com uma espada enfiada no pescoço. Nós é que por vezes nos iludimos dizendo que não ifaz mal não realizarmos nada de importante, não povoarmos américas, não desafiar o papa, não enfrentar filas enormes de supermercado.
Mas como fazer tudo isso vivendo numa ambigüidade e numa alternância terrível entre a mesquinharia e a impotência? Se não nos julgamos capazes de fazer tudo isso de livre vontade?
Com alguma sorte seremos condenados ao degredo em alguma ilha selvagem, e sendo obrigados a sozinhos fundar um Estado, aprendamos talvez alguma coisa. Aí sim, se é grande sem querer, grande como se deve ser, e se tem uma vida propriamente dta.

Se o sabor da vida ficasse nas pequenas coisas, elas por si me satisfariam, me cansariam, tomariam conta de toda minha existência. Ao contrário, elas me fazem escasso, saudoso. Portanto só posso concluir que só é completo o que é grande, e só é grande o que é de todos, comum, é verdade, mas além de ser permitido a todos falta ainda uma martelada na cabeça, um sacrifício, uma luta. Algo que engrandece o mais vulgar dos objetivos a qualquer homem.

Tuesday, August 07, 2007

Esses Mistérios

Parto da pressuposição, uma pressuposição com bons motivos, de que há mistérios no mundo, de que há mistério no que e como as coisas acontecem na vida. Não que não seja uma ilusão acreditar nisso. Mas uma vida desmistificada, sem mistérios, é algo mais ilusório do que acreditar neles. Partindo daí, sempre começo a pensar n'algo de maior inutilidade para todos os outros, ou vocês que lêem isso, mas de extrema importância para mim. Penso qual é o maior dos mistérios, ou o mais significativo.
Diversos são os tipos: porque nossa vida aparentemente deve ter um sentido ou algum significado; depois por que passamos a acreditar nesse sentido ou a buscá-lo, ou imaginá-lo, dando a ele existência; e todas as outras coisas, como por que chegamos até onde estamos, como que somos o que somos, etc. Cada um tem escrita a sua lista de não explicáveis. É interessante ver que apenas o reconhecimento destas dúvidas já cria a dúvida em si, sem que ela seja necessária do ponto de vista lógico.

O maior deles, em minha opinião, é por que, sendo possível enxergar, ou deduzir o que acontecerá de ruim no futuro, um futuro não-desejável, nós continuamos em algumas vezes, a seguir este caminho, não por teimosia, por burrice, mas porque isto "deve ser feito". Aceitar o destino, em outras palavras. É certo que muitas das vezes, aliás, na maioria delas, nós lutamos contra ele, definitivamente, uma luta mortal, trágica. Em outros casos, esses os mais interessantes, reconhecemos nos destino terrível algo tão hipnotizante e misterioso, que vamos de encontro a ele.

Creio que seja além do principal, o mais belo mistério de todos, pois se percebe que o ser humano é ao mesmo tempo como os galhos de uma árvore, que não se sabe para onde vão crescer, e divino, pois nele há uma certeza pressuposta (num outro mundo) e, talvez voluntária, de para onde vão crescer. Essas duas coisas que fazem a vida seguir, tem feito seguir, e diante disso só resta a nossa perplexidade.

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Friday, August 03, 2007

Os meus pesadelos. (escritos autobiográficos)

Busco ainda interpretação psicanalítica para meus pesadelos. Só pude interpretar perfeitamente um sonho, numa noite que sucedeu o dia em que tinha terminado de ler "mal estar na civilização". Foi perfeito: estava lá meu pai, minha mãe, mulheres nuas, vestidos vermelhos, salas vazias, livros velhos, crianças endiabradas, criados uniformizados... uma festa. Creio que sofri do que chamei de idealização do inconsciente (algo análogo à idealização do ego), isto é, meu inconsciente, vendo que os conceitos de Freud eram muito mais interessantes que o mais confuso e sujo dos meus segredos, simplesmente recriou aqueles símbolos, ordenadamente. É um pouco decepcionante, pois ninguém espera isso do inconsciente, esta subordinação e admiração total.

Na maioria das vezes não sonho, tenho só pesadelos (diria porque sonho já demasiadamente durante o dia, e meus pesadelos não são terríveis, quer dizer, mão são violentos, cruéis. Normalmente, não riam, eles acontecem em agências bancárias, mas não presencio assaltos, não testemunho o drama de reféns caídos no chão. Meu drama é quase sempre o mesmo, tendo algumas variações de um dia para o outro.

Estou diante de um caixa eletrônico (um ATM), insiro meu cartão, e ao me pedirem a senha, eu digito normalmente só que ela é inválida (esta é a melhor síntese biográfica da minha vida e da de qualquer outra pessoa, estou convencido), e então para confirmar meus dados o computador me pergunta qual meu prato preferido, o nome do meu cachorro, minha cor preferida. Respondo todas essas perguntas uma atrás da outra até ficar extremamente angustiado com a situação. A cena se prolonga infinitamente, até eu acordar, como se as perguntas não acabassem.

Ontem, de novo, estava diante do caixa eletrônico, mas, (que surpresa!), digito a senha e ela funciona, para retirar vinte reais. Fico esperando o dinheiro vir, e como sempre faço na vida real, desejo que a máquina erre a contagem e me dê um bolo de dinheiro. Um dia poderia acontecer, acho.

o dinheiro saí e são quatro notas de cinqüenta reais. Meu desejo se realizou. Esta felicidade dura alguns instantes, mas logo vejo num extrato que surge na minha mão, que aquele dinheiro foi debitado na minha conta, e que estou negativo no banco.

Olho o ATM e há um relógio digital que marca os juros em dinheiro, a cada segundo, que devo por ter aquela dívida. E o número vai crescendo rapidamente até eu ficar bastante angustiado. Tento usar o telefone, e nada.

Acho que há alguma relação com a minha vida em geral, bastante na verdade. Mas não posso negar também que posso ver o pesadelo como uma não metáfora, já que tenho mesmo pavor viceral de caixas eletrônicos, e todos os outros procedimentos bancários possíveis.

Sunday, July 29, 2007

Odeio

Odeio todos os calendários
Os que compro, os que ganho de presente
Os que acho em casa, nos armários
Os que vem pelo correio de repente

Odeio todos os oceanos
A distância que dão aos continentes
Os quilômetros, deus, são tantos
Que não há um só que agüente

Porém, embora nefastos
E ambos tão pouco amansados
Os calendários são pra serem gastos
E os oceanos atravessados

Não os odeio tanto.

Wednesday, July 25, 2007

debate sobre o uso de drogas e emancipação

Há algum tempo discuto com meu amigo José Francisco a questão do uso de drogas e etc. é lógico que é um tema bastante amplo. Mas achei interessante as últimas discussões e publico um recorte deste debate, os dois textos iniciais para falar a verdade. Quem quiser acompanhar seus desdobramentos e complementos pode checar a comunidade Aléchis Brasileiro no orkut. Nós não somos nenhuma autoridade no assunto, somos no entanto seres pensantes que podem ter opiniões sobre as coisas do mundo. Eis os textos.

Chico - Sobre a emancipação
(bom primeiro queria esclarecer que isso é a minha opinião e em nada tem a ver com os outros membros da comunidade e muito menos com a taça cudizio)

Eu acredito que as drogas PODEM SER um escapismo. e se entendi bem o que vc pensa de emancipação, um escapismo é algo alienante e por isso contrário à emancipação. No entanto até ai a religião, a televisão, a arte e diversas filosofias podem ser escapismo. Então eu penso que o que faz de determinada idéia ou substância alienante ou não é o seu uso.

além disso eu encaro o uso de psicotropicos em geral, maconha e alucinógenos essencialmente, sob a ótica que Aldous Huxley expoe no seu genial "as portas da percepção". Essa ótica defende basicamente que as drogas são uma forma de atingir estados extraordinários da percepção. Ou seja, que atravéz delas podemos obter uma nova percepção da realidade e que essa nova percepção é benéfica.

Essa percepção é mostrada como benéfica por possibilitar uma nova forma de "aprendizagem" a partir da realidade, que não a partir da experiência racional. É uma nova apreensão da realidade a partir de experiências sensoriais. Além disso é uma forma de entrarmos em contato com o que ele chama de "antipodas da mente", que pode ser vulgarmente traduzido como subcobsciente. Assim o que huxley defende, e eu concordo, é que as drogas podem possibilitar um mergulho no seu subconsciente completamente impressionante, chegando ao ápice de seu subconsciente projetar a realidade(alucinações) para que essas sejam absorvidas pelo seu consciente.

Seria impossível resumir todo o livro em alguns parágrafos mais acho que o ponto central é mais ou menos isso. qq problema esclareço.

Além disso eu sigo na minha vida uma filosofia completamtente antagônica ao estoicismo como dizia W. Blake: "só o caminho do excessos conduz ao palácio da Sabedoria." acredito nos excesso como vivência positiva, por mais que isso renda prejuízos. Talvez isso seja uma tendência ao epicurismo, mas teria medo de afirmar isso porque desconheço ao certo o teor da filosofia
concluindo
assim a conclusão é que: as drogas são uma forma de autoconhecimento e o autoconhecimento é sim um possibilidade de emancipação. Uma emancipação de toda a realidade opressora. Veja bem, isso nao quer dizer viver loucão, quer dizer experiências com drogas.

Para além disso os excessos no fundo são uma forma de contato com as experiências em seu estado mais bruto. se for algo que seja inteiro, que seja extremo. Algo como a poética da radicalidade, mas uso isso em minha vida muito mais relacionado a filosofias e idéias, do que ao uso de drogas. O excesso se tratando substâncias psicoátivas é um comportamente que deve ser combatido caso afete, e normalmente afetará, na vida de terceiros. Assim, um viciado sempre deve ser evitado.

E por fim, acredito que cada um tem o direito de escolher a forma de encontrar a sua felicidade e que sobre isso não cabe qualquer julgamento. Para mim isso é um direito inalienável e mesmo que eu não concorde com essa forma tenho que respeitar e nao posso, de forma nenhuma, dar qualquer demérito ao indíviduo por isso. Pois nao existe felicidade melhor, existe felicidade. E único ser apto pra julgar se é feliz ou não é o próprio indivíduo.

ps.: enquanto escrevia isso vc respondeu meu primeiro post, então já digo se vc nao se incomoda em conviver comigo sobre efeito de qq substância, não há porque segregação nenhuma, está certo? sendo assim gostaria de contar com vc mais vezes em nosso eventos.


Diogo - Bem, vou usar este texto base do Chico para colocar os meus contra-arguentos, bem como os meus argumentos.

O conceito de emancipação é bastante problemático, logo não pretendo esgotá-lo aqui pois seria um tanto pretensioso e provavelmente enganoso da minha parte. Não quero, no entanto, falar generalidades e ser superficial. Por isso vou desenvolver um raciocínio que procure chegar ao menos na substância principal da emancipação.

Como o homem passa a ser livre? O homem já foi escravo, já foi servo, e hoje é assalariado, proprietário em alguns casos. É um caminho de emancipação, pois ninguém possui, ou pode possuir, o corpo, a vida do outro. Mas não é só isso.

Há dois pólos dos quais o homem deveria ter total controle para ser livre. Não só sobre sua vida, seu destino e sobre sua felicidade, mas sobre sua consciência (Espinoza). Sem a consciência, o homem não se dá conta de seu lugar na história, e do significado de sua existência no mundo.

O que há contra isso? Ora, há diversos tipos de dominação. Hoje, mais do que a dominação econômica, há uma tentativa de dominação da consciência, ou melhor, uma tentativa de atrofiar o desenvolvimento dela. O uso de drogas é uma das coisas que atrofia a consciência, em vez de expandi-la, pois anestesia o ser humano, por um tempo, ou por muito tempo. “O ópio faz dormir por causa de suas propriedades dormitivas”, é um exemplo de tautologia que eu achei num livro de lógica. Bem, os sentidos oferecem as ferramentas para a consciência se desenvolver. A percepção dos fenômenos forma a consciência, logo. Então o que você disse sobre trazer as experiências das alucinações para a realidade é verdade exceto por uma coisa: Não é certo este caminho de volta. Ele depende do uso da faculdade de pensar, e do desenvolvimento prévio da consciência.

Numa sociedade em que nascemos para sermos desligados, a experiência do uso de drogas só pode levar a uma expriência separada da realidade objetiva e incomunicante com ela. Alguém que conheceu a realidade apenas pelas representações e sombras da caverna de platão, não pode nunca imaginar como seria levar seu inconsciente a uma realidade que nunca conheceu diretamente pelos sentidos apenas mediatizada por imagens (capital). Por isso, os sentidos, embora sejam essenciais para a formação da cosnciencia, não são capazes de reconhecer quando se está numa prisão tão prazerosa e atraente como a que vivemos.

A estrada dos excessos leva então ao porto da servidão inquestionada. A maioria dos políticos do mundo não vêem problemas nas drogas, pois elas não mais representam uma ameaça ao status quo. George Bush usou maconha quando era jovem, assim como todos os novos candidatos a presidente dos EUA. E quanto aos outros usuários que usam drogas sem mesmo pensar em emancipação?

Portanto, a única maneira de impedirmos o atrofiamento de nossa consciência é negando o máximo de anestesias possíveis, o que não é nada prazeroso. A dúvida se somos livres ou não, e portanto capazes de fazer o “caminho de volta” é eterna como a dúvida de Pascal se existe céu e inferno. Mas prefiro não arriscar tanto, arrisco pouco, pois talvez, a consciência vá ser um dia a única coisa que vá me sobrar.

Wednesday, July 18, 2007

Paris, Je T'aime

Este, para mim é um dos melhores filmes dentro do filme. Acho completo em termos da sensibilidade que possui e caracterização da personagem.

Monday, July 16, 2007

Identidade Brasileira

Sempre há gente nos meios de comunicação, nas discussões da universidade que quer imputar uma identidade ao brasileiro, seja para identificá-la a certos ritmos musicais ou a certos costumes.
Estas tentativas não só são permeadas por preconceitos e enganos, como têm uma característica perversa, de colocar de fora, tomando o aspecto até de ideologia, muitos brasileiros que são outras coisas, que não ouvem música regional, não dançam, e não usam do "jeitinho", não são hospitaleiros, tampouco cordiais.
Estamos muito bem, vivendo na ausência de qualquer caráter. Só os países velhos precisaram, por fatores históricos, que a elite afirmasse uma série de características do povo, que tomou vida própria. No caso da Inglaterra, por exemplo, Burke, enumerou as características do povo inglês, e relacionou-a diretamente com a liberdade que aquele povo desfrutava, que aliás, segundo ele, os franceses teriam dificuldade em ter.
Aqui a elite é tão vulgar quanto o povo. Não há a menor necessidade de que ela tenha o povo espelhado à sua imagem, e se haver necessidade, ela será mentirosa. Aqui o Odi Profanus Vulgus, a tradicional arrogância de qualquer elite de qualquer país, em relação à passionalidade dos mesmos educados, menos cheios de "classe", é uma heresia, é considerado um pecado mortal, e será condenado em qualquer próxima novela da globo.

Por isso, como diz uma amigo meu, um metaleiro de curitiba e um peão de fazenda no interior de minas são, culturalmente, tão brasileiros quanto eu, quanto você. Não tenhamos a pretensão de dizer que um é mais brasileiro que o outro pois isso é uma usurpação simbólica perigosa. A cidadania de um depende da legitimação social de todos os outros cidadãos, e não está evidente que os governos devam ouvir mais um grupo do que outro, se quiserem buscar uma identificação com a nação ou uma afirmação da nacionalidade.

Quanto mais afirmarmos nossa falta de identidade (ausência positiva), mais perto estaremos da tolerância (uma tolerância diferente da permissividade) e da liberdade.

Thursday, July 12, 2007

A vocação da TV

Agradam-me os reality shows de perda de peso. As pessoas são forçadas a entrar num regime militaresco, em que, no início, como uma espécie de estratégia de desmoralização, se mostram todas as comidas que elas comem em uma semana, numa mesa só. Uma vez botaram vários quilos de cereal com leite numa banheira, e fizeram uma senhora pôr uma roupa de banho e entrar lá.
Não sei o que dá em mim. Mas toda vez que vejo toda aquela comida espalhada, aquela abundância, aquele exagero, me dá um prazer sem medida. Eu assisto o programa até esta parte, depois procuro outro programa na TV. TV tem que ter espetáculo, e um monte de comida junta é espetacular.

Quem já assistiu TV escola sabe do que eu estou falando. A rede cultura é pretensiosamente educativa em alguns programas, mas tem ainda seu punhado de ridículo, seu pedaço de espetáculo. Eu gosto do "Sr. Brasil", aos domingos, com aquela platéia octogenária, que canta as músicas de cor. Aquele agrupamento de aposentados é o maior trunfo do programa, além das boas músicas uma vez ou outra, obviamente. Ver aquelas pessoas cantando as músicas da sua época em que eram jovens e ouviam as modas daquelas pessoas que sempre há nas cidades do interior é revigorante. A expressão delas é brilhante.

Por isso não sou um medieval, que quer distribuir diversão pública, e proibir a educação na TV, mas a TV tem uma vocação para o espetáculo, não é coincidência que ela surgiu e se popularizou na segunda metade do século XX. Alguns poderiam dizer que o avanço tecnológico que trouxe a TV, mas digo que além do avanço tecnológico há o peso de uma época.

Até a ópera pode aparecer na TV. principalmente esta cena de un ballo in maschera, de Verdi. Passaria sem problemas, no horário da novela. A história é bem conhecida por nós: mulher se apaixona pelo melhor amigo do marido, etc. Tem morte no final, só que sem traição de fato (carnal) por parte dos dois, era um amor verdadeiro, o que dá um remorso danado no assassino enraivecido.

Infelizmente, não achei no youtube o trecho final "ella è pura" que eu queria. O que tem, não está inteiro. Este "teco io stò" é legal também. A mulher está com um medo de manchar sua honra e sugere se afastar do amado, etc. É um trecho muito bonito, pelos dizeres românticos. como esse, que diz mais ou menos "que tudo desapareça, menos o amor":

M'ami, m'ami! . . . oh sia distrutto
Il rimorso, l'amicizia
Nel mio seno: estinto tutto,
Tutto sia fuorchè l'amor!


Legenda em espanhol.






eu sei que não tenho escrito coisas literárias... Mas volto à forma.

Monday, July 09, 2007

Tempo Livre


Esse não sou eu. É um eu primitivo que agente deixa de ser depois de um tempo, mas. por necessidade ou dever, nunca abandona. Não é uma foto pessoal, mas é o conflito de qualquer pessoa sob as mesmas circunstâncias que eu (ou seja, quase pessoal), que crê que apesar de viver momentos contentes, estes não são senão uma sucessão de imitações da alegria verdadeira anterior.



Não é nostalgia. É um resgate: algo mais ativo que nostalgia.



Dentro de alguns dias eu volto a postar neste blog coisas melhores.

Friday, July 06, 2007

A glória do fracasso

Cada vez descubro algo novo em que fracasso. É como quem tem um album de figurinhas e não faltam nem muitas nem poucas para se completar, é aquela fase intermediária típica.
Esses dias obtive um sinal de minha inaptidão para coisas relacionadas à economia. Vale dizer que é o que eu escolhi estudar para a minha vida, então há certa importância nisso. Não é como descobrir, por exemplo, que não tenho talento para botânica.
Botânica, aliás, é algo que eu gostaria muito de saber quando estiver na meia-idade.

Digo tudo isso não por gostar de descobrir minhas fraquezas. Mas que há algo de heróico, ou anti-heróico, em aceitá-las como parte da sua vida, e até da sua identidade, ah, isso sem dúvida que há.

Sustento, pois, que todos merecem fracassar, todos merecem esta glória, estes louros.
E os perfeitos, vejam que estúpidos, que não se esborracham, não terão nunca nenhuma derrota para se vangloriar. O perder é tão maior que o erro, que ela até serve para expiar as decepções individuais. Há sempre um ar de mistério circunstancial ou fatalístico naquele que perde.

Talvez por essa razão, a glorificação do fracasso seja a única alternativa para aqueles que têm se afogado no mar da derrota, e se esfregado nos assoalhos públicos das incapacidades.

Saturday, June 30, 2007

Liszt



Eu sou um estudante de piano frustrado. Gosto de piano, tenho ouvido Liszt e ele é sangue bom. Há um vídeo de um interprete húngaro Georges Cziffra, um pouco polêmico, pelo pouco que sei.

sem título

o que quero dizer, quer dizer,
o que quero insistir em dizer,
é que, para além dos altos custos de energia elétrica,
e para frente dos dias sem graça e chuvosos,
há, e isto é minimamente possível,
dias chuvosos totais, abundância de lirismo
e poesia - não nominável - em todas as partículas
dos seres...
basta, para sentirmos, fazer a escolha dolorida
de viver desejando isso.

Saturday, June 23, 2007

O mito da igualdade

É quase senso comum que o discurso em favor da liberdade (pensemos no sentido econômico, por enquanto) é próprio dos economistas do "mainstream", enquanto que pensar em igualdade é algo mais heterodoxo, de esquerda. Vejam que lia um livro do Pierre Rosanvallon, e achei uma reflexão interessante.
Bem, de fato, a desigualdade tem um papel importante no mercado. As pessoas trocam uma coisa por outra no mercado porque não são iguais, se todo mundo tivesse as mesmas coisas não haveria porque trocar. Mas como o livre-mercado seria algo que funcionaria sozinho, com mecanismos de auto-ajuste, é preciso que os agentes ajam de uma maneira autônoma, pensando em si mesmos, não nos outros.

Ou seja, a sociedade do livre mercado é uma sociedade sem os simbolismos dos contratos sociais, políticos. É um efeito mecânico, como o da física clássica, ninguém precisa concordar com nada por convencimento. As pessoas só concordariam com qualquer mudança, se nenhuma delas, ao final, fossem prejudicadas. Mas vejamos o exemplo em que alguns tem muito, muitos tem pouco. É uma situação complicada do ponto de vista social, embora eficiente no sentido econômico, pois nada pode ser melhorado sem que piore a situação de outro (a mudança nunca poderia ser consensual).
O momento em que uma pessoa passa a agir diferentemente, orientada relativamente ao que o outro pensa ou tem, o outro, há uma distorção no mecanismo de mercado, distorção da racionalidade. Ele perde sua natureza mecânico, natural e torna-se social, político. Os economistas chamam de "inveja".

Surge então o problema da equidade, ou da justiça distributiva. A única forma de fazer com que o mercado funcione, é garantindo que as pessoas tomarão decisões autonomamente, e isso se faz minimizando a possibilidade de "inveja". Logo, igualdade é uma condição necessária para a manutenção dos mecanismos "naturais" de mercado, ela mantêm os problemas de natureza política desnecessários.

A desigualdade abre caminho para a interação, e o reconhecimento do outro (alteridade?), da influência do outro na nossa existência, na nossa consciência. Dizia Marx que o homem se vê parte do gênero humano não olhando para si mesmo, mas olhando seus pares.

Por isso (voltamos ao senso comum), os ideais de igualdade têm uma natureza ambígua. De um lado todos concordamos que devemos ser iguais, mas ao mesmo tempo, que devemos ser diferentes.

É engraçado como mudando a linguagem apenas, estamos sempre nas mesmas questões.

Saturday, June 16, 2007

Registros

Quem inventou esta história de ser gente?
Ser gente de verdade é estúpido. Gente.
O doce mesmo para o mundo é fingir ser (não ser sendo) qualquer outra coisa.
Coisa, espalhe-se esse som, doce,
Que fique registrado, e ouça-se o barulho enquanto datilografo.

É bom fingir que não se é, não ser,
[Não um fingir de fingidor
Aquele que o faz por amar o real, por ser gente]
É algo que vai além, além da cotidiana mesquinharia,
Além até do criticável,

A mesquinheza de todos nós, isto sim vale,
Isto sim nos torna gente,
Mais que toda compaixão e todos os donativos para a campanha contra o câncer,
Mais que todas as entidades filantrópicas juntas e todos os organismos internacionais juntos

Ser puro, asceta, esterilizado, estéril? Vamos ao Tibet fazer proselitismo.
Só fazê-lo, em nome de nada.
Registre-se, céus, carrinhos de bebê parados neste parque
Importa aqui é ser um nada flutuando, um nada funcional, a nadar funcionalmente e sem rumo

E para quê vou eu adorar um deus que foi também humano?
Humano, meu deus, humano.
Vou rezar...com quais funcionalidades?
Ufa. De certo que ninguém são, aqui, rezaria a um humano.
- O meu quarto não tem espíritos (!) -
- As formas da sombra da minha cadeira não são sobrenaturais (!) -
- Então não vou agradecer a um humano pendurado na parede -
Que expressa sofrimento

Para quê? Ora, para quê.
Cesse esta covardia anti-humana
E registremos juntos, calçadas esburacadas, sentem-se cá comigo,
Que se há algum motivo para rezar
Ou para agradecer
Ele se deve a não-existência do sobrenatural
Pura e simples, se deve sim a – nossa - existência!
À nossa humanidade
Nossa mesquinheza.
O terço aos indesculpáveis
O rosário aos sovinas.
Todos os dias rezo um pai nosso à minha oleosidade
À minha permissividade, à minha fraqueza
Ao meu correr chorando por atenção
Rezo pensando nisso junto à minha cama

Escutem as mudas recém envenenadas pelos vizinhos,
Escutem-nas, formigas agora sem formigueiro,
Decaptaram aqueles mais gente, que foram gente no passado,
Esquartejaram todos os deuses,
Mantiveram o que era inofensivo aos olhos deles,
Deles os quais não sei quem são,

E o que botaram no lugar?
Uma moral esdrúxula, e princípios mais esdrúxulos ainda,
Botaram uma moral sem beijos melados o bastante,
Sem narizes escorrendo, sem suor e sem carnes em excesso
Colocaram no lugar de deus, o mundo construído sem deus
Sem deuses rechonchudos
E no lugar da alegria, botaram alegria
No lugar de todo o resto, ficcionaram todo o resto
Assim podemos julgar viver bem
A única diferença do mundo que eu vivo,
E do mundo que eu gostaria de viver
É que naquele falta palpitar, o palpitar usual
É que naquele falta a ruptura do nascimento inercial de um bebê

[Em vez de pularmos das janelas
Pensemos na realização de um esporte radical]

Voltem-se para mim, janelas quebradas
Registremos o andar espaçado do homem meio contente
À caminho do supermercado cuja fila no caixa é quilométrica
Guardem na memória este, pior de todos, que vos escreve
(E que por coincidência é o mesmo a andar, meio contente, a caminho do supermercado)
Que dentro de uma hora será ultrapassado,
Pela demora nas filas dos caixas
Pela lógica inexorável dos acontecimentos
Pelo atraso cada vez mais inesperado dos meios de transporte públicos
Por sua vida cada vez mais dolorosa e cada vez menos sagrada.
Que é do tamanho de um cartão bancário, cuja senha se esqueceu
Cuja alma tem se sentido presa, numa camisa de força, tão espetacularmente presa
Que quase não se reconhece como alma, mas como gosma
E vê nos tantos outros passantes, uma natureza menos repugnante que a sua
E sente, ao sentir, um orgulho inegavelmente imperdoável

Wednesday, June 13, 2007

Soneto

Corre, séria, com o cabelo preso
E não guarda esse sorriso para mim
Que as flores secas do meu jardim
Te entristecem e causam desprezo

O amor convenceria, cor de rosa
Não fosse feio, rude meu coração
Amargo em acender qualquer paixão
Com ti vislumbro sombra tenebrosa:

Já num pisco, de repente num momento
Verei que não tens amor infinito
E além que não foste apaixonada

Então afasta-me o brilho que fito
Que faz minha vida solucionada
Que dá aos meus dias tamanho alento



(algumas alterações a serem feitas.)

Sunday, June 10, 2007

Comentários.

Em São Paulo, hoje foi o dia da parada gay, ou dia do orgulho GLBT, como chamam. Foi também o dia em que a Cidade deve ter coletado mais ISS do que em qualquer época da história. Sob a ótica de um governo, o dia do orgulho gay termina normalmente com um saldo muito positivo, tanto no sentido da coleta de impostos, como também porque é um evento de grandes proporções, e que se comparado ao GP do Brasil, por exemplo, não incentiva um número muito grande de atividades ilegais.

Digamos que o Grande Prêmio de interlagos é o exemplo ao contrário. Tráfico de cocaína e prostituição (na verdade a exploração de prostitutas, já que a prostituição não é considerada pela lei brasileira ilegal, somente o agenciamento) sobem demais. Mas mesmo este evento traz alguns benefícios a cidade. Em geral, São Paulo ao sediar esses eventos se reafirma como uma cidade especial.

****
(Gostaria de escrever uma outra coisa que não lembro. Vou parar de escrever sobre mim no blog, sempre me policio para isto, mas as vezes acabo fazendo. É uma falta de vergonha.
Talvez escreva menos por esse tempo devido ao início dos exames finais.)

Monday, June 04, 2007

Servidão

Não sei se servimos para alguma coisa
Acho, pessoalmente, que não devemos servir para nada
A não ser para dizer coisas sem sentido
E irritar os outros. E talvez andar na rua e cantar.

Uma parte de mim serve. Por isso, às vezes me sinto mal.
Uma parte de mim me faz sentir mal quando irrito as pessoas
Por conclusão estou quase sempre mal.
Tirando as horas em que canto sozinho andando na rua.

****************

Tenho ficado um pouco sozinho. Sozinho integralmente. Como quem precisa fazer uma excursão.

Friday, June 01, 2007

Decretos do Serra

É lógico que eles restringem a possibilidade da universidade gastar, ou aumentar gastos, pelo menos os aumentos terão maior controle. Tem gente que tem isso como uma descoberta brilhante. Mas não entendo como usam como um argumento para a greve, e não serve como argumento a menos que se introjetem alguns juízos de valor:

a) é bom para a sociedade que a universidade amplie os gastos
b) o governo ao desejar controlar os gastos da universidade está fazendo mal a ela.
c) a greve é a melhor estratégia política de pressão para obter a revisão dos decretos
d) as greves períodicas não afetam a qualidade do ensino, enquanto que os decretos sim.

Por mais que nos sintamos tentados a concordar com estes juízos de valor, estes são plenamente discutíveis e é por isso que venho chamando atenção para o fato:

a) ampliar os gastos significa diminui-los em outras áreas, se se quer (e se deve por imposição legal) respeitar a lei de responsabilidade fiscal.
b) A universidade é financiada por impostos regressivos e possui uma clara desigualdade no acesso, de modo que não cumpre totalmente seu papel social, e também não forma elites dirigentes. Universidade pública não é senha secreta para abir qualquer cofre, ingênuo é quem o pensa.
c) a universidade não é um serviço público vital, portanto sua paralização demora meses para chamar a atenção e ter eficácia, ao passo que a universidade tem outros meios políticos de fazer pressão, muito mais eficazes, aliás, estes que vão dar solução ao impasse.
d)As duas ações tem relação direta e negativa com a qualidade do ensino, e com a formação acadêmica dos alunos.

Isto nos dá alguns instrumentos para levantar algumas dúvidas (cartesianas) benéficas e corrigir o rumo deste movimento. A assembléia é hoje.

Tuesday, May 29, 2007

um pouco romântico

mas essa lua
mas esse conhaque
botam a gente comovido como o diabo


Ainda que longe, mais vasto é o tamanho do não-esquecer-te. Eu hoje dei um tropeço, e alguém conhecido na rua me viu, e riu, mas eu não ouvi. Passei a tarde exercitando um poder de materialização que minha mente nunca teve e terá, mas o poder de lembrar, aquele que não exige dela nada além da obviedade de reter o que é belo, ela felizmente tem. É por isso que você me aparece no sofá, na televisão, no computador, no teto, no céu, no espelho; É por isso que se tivesse nascido cachorro, tu serias o meu passeio a tarde, se um templário, o meu graal, se criança, o sorriso de minha mãe, e se fosse eu uma laranja ridícula, e por isso vivesse para nada, você seria a minha forma, minha cor, e meu gosto, aquilo que me fizesse de fato laranja.

Por isso carrego você para todo o lado, por todos os cantos da minha vida.

Sunday, May 27, 2007

Discutir ou Fazer.

Ultimamente, tenho testemunhado algumas discussões em que me dizem que eu deveria discutir menos e fazer mais. Que se eu critico os que fazem, eu deveria é tentar fazer no lugar deles, ou propor alguma alternativa.

Nobilíssima a crítica à minha crítica. Eu, do mesmo modo, desgosto de quem chia, mais ainda chiar e não fazer. É, porém, e infelizmente, uma retórica falha, pois não resguarda ao outro o direito de expressão, da simples, livre, e unidimensional expressão das idéias.

A discussão é o estágio intermediário do processo de pensar, que se materializa na ação.

Por isso, temos sempre de rebater as críticas dos que fazem e dos que não fazem, assim é a vida. Isto é um fato. Porque as ações são reflexos das idéias expressas e de outras ações, e as idéias expressas são reflexos das ações e de outras idéias. Nesse sentido, discutir, se se pensou previamente, também pode significar fazer. Eis que quem pensa, um dia deve agir, e quem age um dia, ou uma hora, deve pensar. Aqueles que só fazem, um dia perdem o senso crítico, e os que só pensam, a forma. No entanto, há a hora certa para cada coisa, e num momento da vida se privilegia uma em detrimento da outra, talvez por um período de formação intelectual, ou do outro lado, por um tempo de maturidade e poder.
Isto não é nada de genial.
Acordei assim.

Não escrevo sobre a greve na universidade nos últimos dias é apenas o que tenho feito bastante.

Saturday, May 19, 2007

Lágrima

*poema antigo, mas tem seu charme. Ultimamente estou com 15 poemas feitos pela metade, que não consigo terminar.

Há uma lágrima.
No fundo de meu olho.
Escondida,
E Não sei,
Nunca apareceu

Já deveria ter saído
Há muito tempo
Esses meus dias têm sido tão duros
A minha vida tão fatigada
De que serviria esta lágrima
Senão para escorrer logo
Por minha face;
Senão
Para carregar consigo
O semblante triste de alguém
Cansado de viver

Mas ela não sai,
Não sai,
Faço força,
Que terá acontecido comigo?
As estátuas não choram
Nem nunca choraram

Fico, de tão fixado,
A esperar esta lágrima redentora
Este sonho, este beijo d’alma
Em algum tempo e espaço
N’algum sentimento...
Sim!
Sinto-a!
Ela aos poucos se revela
E sinto meus olhos úmidos
Finalmente!
Mas,
E se forem apenas as gotas
Dessa garoa que se inicia?

Friday, May 11, 2007

Sobre a existência

Gostaria de saber responder porque os indivíduos são o que eles são. Indaguei-me isto hoje e fiquei, vá lá..., com um nó na minha cabeça.
Por conveniência ou segurança, sempre tive uma idéia determinista da nossa existência, ou seja, sempre pensei que se somos o que somos (ainda que não saibamos dizer exatamente o quê), isto é devido à nossa família, nosso círculo social, nossa cidade, nossa renda, todas essas características externas a nós. Ou seja, nascidas pessoas sob mesmas condições culturais, materiais, é provável que elas não sejam muito diferentes de um certo padrão de costumes, de idéias políticas etc. Não quer dizer, já para rebater possíveis críticas, que dadas essas condições é fatal que sejamos de um jeito.

Digo que esta idéia me dava segurança porque é uma maneira de pensar bastante objetiva, e descarta, portanto, qualquer viagem idealista do tipo "eu sou eu", de Ficht, e as relativizações complexas do nosso tempo, que eu nunca entendi. Se o homem é homem, ele o é porque se relaciona com outros homens e com o resto, e conhece, objetivamente, outros homens e as coisas (que não são homens). Esta é uma idéia que aparece em Marx, por exemplo, mas em Kant também. É uma idéia até aceita por alguns bons filósofos. Deixei de lado o subjetivismo pois é dificil eu confrontá-lo com outras pessoas.

Ocorre que hoje surgiu-me uma dúvida. Suponhamos que 10% do que somos fuja a esta regra determinística, e que não seja possível encontrar nenhuma ligação com a nossa história e nosso meio, com o que nos transformamos. É uma suposição razoável. Isso implicaria em ser, em parte, uma aberração, em ter algo de inexplicável, imponderável. Em alguma pontinha de nossa existência, o eu só poderia se afirmar pelo próprio eu, e nada mais, não se podia rastrear qualquer origem daquela característica.

Alguém poderia dizer que é nessa região que cada homem se faz único, inimitável, imprevisível, por isso humano. Eu pensando comigo hoje, conclui que eram nesses 10% que ele se sentia completamente, inevitavelmente solitário e cinza, como me senti hoje.

Saturday, May 05, 2007

CENA 11 – Pobre Detetive Scott

EXTERNA – PRÉDIO DE SCOTT - DIA

O Delegado e Manuel estão na escada do prédio de Scott.

DELEGADO
Me ajude aqui Manuel, você que colocou tudo a perder, carrega esta caixa aqui.

O Delegado dá uma caixa para Manuel, eles entram no prédio, e caminham em direção as escadas. Eles sobem as escadas, em direção ao apartamento de Scott.

MANUEL
Que nós vamos fazer chefe?

DELEGADO
Chefe?! Você é meu capanga agora? Eu não sou seu chefe, sou o delegado, você é um atorzinho que nem na revista Caras nunca saiu.


MANUEL
Saí sim, na parte de flagras!

DELEGADO
Apareceu sua calcinha na foto?

MANUEL
Não, eu apareci um pouco de relance assim, do lado da Ângela que estava com o vestido decotado.

DELEGADO
Ela era um pitel, não é?

MANUEL
Ô... Mas nós enfiamos a faca nela! HEHE

DELEGADO
SHHH! Cale a boca. Chegamos no apartamento dele.

MANUEL
Que nós fazemos agora, chefe?

DELEGADO
Chefe é a mãe, entendeu!? Agora, nós vamos colocar a caixa bem aqui na frente da porta dele e vamos tocar a campainha. Aí nós damos no pé.

MANUEL
Tem certeza que vai dar certo?

DELEGADO
Claro, o que poderia dar errado? Nós colocamos a caixa com os itens pessoais da Ângela na casa dele, dizemos que as anotações dela no diário se referem a um amante, na verdade ao próprio detetive Scott, que vivia um caso secreto, a Dalila confirma o fato chorando e pronto. Podemos incriminar o detetive Scott.



MANUEL
Eu gosto muito dessas horas em que o vilão explica todo seu plano diabólico antes de colocá-lo em prática. Vê, isso aqui é lindo!

DELEGADO
É, É, vai pro diabo que te carregue! Se prepare que eu vou tocar a campainha.

Os dois param na frente da porta de Scott. Manuel deixa a caixa delicadamente no chão. Os dois preparam-se para correr, tocam a campainha e saem correndo.

DELEGADO
Sai, sai, sai homem!

MANUEL
Já vou!

Os dois saem correndo tentando sair do prédio, desesperados. São parados na saída por alguém que reconhece Manuel como celebridade.


Não acredito! Requião Queiroz o grande vilão!!

DELEGADO
Minha amiga, este homem é um estorvo na sociedade, você só pode estar de brincadeira!


Não! Eu ouço suas novelas desde pequeno, torço sempre para te darem papéis melhores, a sua altura.

MANUEL
Obrigado, não sei nem o que dizer.

O delegado leva as mãos a cabeça e começa a puxar sua própria pele.



DELEGADO
(FALANDO EM VOZ DE CHORO)
Por quê? Por quê? AÍ meu deus, olha lá o detetive, olha lá, olha lá ele.

Scott aparece na entrada do prédio, olhando para os lados, procurando por alguém.

SCOTT
Bom dia senhores! Vocês viram o zelador por aí? É que parece que eu recebi uma encomenda, mas não me mandaram assinar nem nada, acho que foi um engano, de qualquer forma eu coloquei lá para dentro né, pode ser algo importante.

Scott e o Delegado ficam quietos, enquanto Manuel dá um autógrafo para a fã.

SCOTT
Pêra aí!? Seus delinqüentes, eu vou colocar vocês na cadeia! Vocês planejaram a morte da Ângela, eu arranquei a confissão do Manuel!

DELEGADO
Manuel, eu sei que deve estar legal posar aí de miss universo e dando autógrafos. Mas agora, mais do que nunca, nós temos que correr mais que o João do Pulo!

MANUEL
João do pulo saltava, não era mesmo?

DELEGADO
Ele devia correr também, não?

MANUEL
Sim, sim, pra pular tem que tomar distância e correr!

Os três ficam em silêncio.

DELEGADO
(GRITANDO - VAAAAAAI!)

Tuesday, May 01, 2007

II

No fim,
Minha vida fora aquilo que imaginava
Um monte de sangue adicional correndo
No mundo,
E ainda mais sem ninguém para admirar
A beleza do sangue que corria em minhas veias.
Capaz era meu sangue de explodir esse mundo
E virá-lo de cabeça para baixo
Mas a verdade é que passou sem grande estrondo

Sunday, April 29, 2007

Suspiro Melancólico e Saudoso

É curioso como as coisas acontecem na vida.

Às vezes eu escrevo para concordarem comigo. Foi nisso que estava pensando quando coloquei esta primeira frase. Acho que ninguém seria de opinião oposta.

Curioso...Mas eu iria um pouco além, é estranho, extraterrestre. E na estranheza há um componente cíclico assustador.

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as provas me impedem de escrever mais.

Thursday, April 26, 2007

linha de raciocínio

Fugiu-me a linha de raciocínio em que estava...



Mas deixe eu lembrar: Acho que estava em
“Você, que em pouco tempo ganhou meus pensamentos inquestionavelmente; provocou em mim a vontade de andar na calçada contente, cantando qualquer música que e estivesse gravada na cabeça; que deixou-me preocupado com o que você achasse de mim...”

“Você é a pessoa que eu fiquei imaginando encontrar hoje.”

E só agora eu entendo porque perdi e tenho perdido completamente minha linha de raciocínio.

Monday, April 09, 2007

Pensamento Positivo.

A maior prova de que pensamento positivo não funciona, é que eu estou há anos mentalizando o bloqueio mental de todos os autores de livros de auto-ajuda, e isso não vem acontecendo, infelizmente. É uma pena, mas cada vez há mais surpresas, inovações, na produção internacional de um besteirol tão agradável.
Eu não tenho nada contra as pessoas procurarem métodos que as façam viver melhor, só digo que é sempre bom desconfiar de alguém que diz que você vai conseguir todo o sucesso que você quiser, e ainda ganha dinheiro dizendo isso. Não é pessimismo, eu até acho que não conseguir tudo o que você quiser faz parte da vida e é essencialmente bom para o caráter.
Um problema básico é esse: Não há BMWs suficientes para todo o mundo. Aí dizem assim: "mas nem todas as pessoas querem uma BMW, por isso é possível que todos tenham o que quiser, alguns ficam felizes, por exemplo, em ter apenas uma bicicleta". Ok... Mas toda essa teoria de que todo mundo, se tiver um estilo de vida tal vai ter sucesso, ignora o fato de que a razão pela qual as pessoas querem uma BMW reside fundamentalmente no fato de que nem todos que querem a terão de fato. Pronto, acabou. Há um vício lógico claro nessas explicações. O ser humano vive de suas limitações, é isso que o delimita e o dá uma certa identidade.
Outro exemplo, digamos que nós estejamos por esperar uma ligação sobre uma proposta de emprego, um emprego bom, desses com vale-refeição e futebol de fim de semana pago pela firma. Você está pensando nisso e recebe a ligação. Fruto do pensamento positivo, obviamente. Agora imagine a mesma situação, só que você recebe por telefone uma mensagem, como essas que recebo tão frequentemente, dizendo "caro cliente, você não está com a conta telefônica em dia, por favor efetue o pagamento ou sua linha será desligada amanhã". Será que isso teria a ver com o fato de que o seu pensamento positivo focado no emprego, não o aliena da obrigação de pagar a conta de telefone (ou talvez de mentalizar a solução), e portanto, seu sucesso estará diretamente ligado ao pagamento dela, que só poderá ser feito, por exemplo, por meio do seu salário que você nunca teria senão conseguindo aquele emprego?
Sei que não parece muito inteligível. Mas se é possível tomar como verdade que o pensamento positivo influencia positivamente no sucesso individual, eu pelo menos acho que como muitos, seria tentado a me policiar 24 horas por dia para tentar arrancar do meu cérebro o máximo de pensamentos positivos, de forma que eles dessem conta de todas as interdependências, e interrelaçõesda minha vida. Minha vida cotidiana, antes tão pacata, terá se transformado numa experiência infernal. Deixem-me quieto, oras.
Por isso não acredito em pensamento positivo. Acho que cada um deve pensar o que quiser, e como diriam alguns filosófos, a nossa consciência é a unica coisa que nós podemos escolher ter controle total. Então, se eu ando por aí pensando que posso ser atropelado, ou que posso ser demitido, assaltado, eu o faço com muito bom gosto, como exercício da minha liberdade. E se eu quiser pôr a culpa nos meus pensamentos, eu ponho, senão, digo que foi o governo, a sociedade, a conjuntura econômica internacional, ou a minha estrutura familiar na infância.
Entre muitas outras habilidades dos humanos, uma das mais valiosas talvez seja a capacidade de poder inventar quem é o responsável pelos acontecimentos, haja visto a crise aérea brasileira. Não é justo nós dizermos que sempre somos nós mesmos, seria uma maldade só, ainda que fôssemos nós mesmos ao final.

Thursday, April 05, 2007

#100

Hoje, relata-se aqui na tela em que eu gerencio meu blog, que este seria o meu centésimo post. Para um diário sem nenhuma importância, é de fato uma marca histórica. Eu queria hoje poder colocar o meu melhor texto. Algo assim, pra fazer as pessoas baterem a cabeça na sarjeta, de tão sublime que fosse ele.

No entanto, não estamos no melhor dos mundos, muito menos no melhor dos blogs. Embora eu escute elogios ao que eu escrevo, com o que escrevo ainda não sou capaz de fazer as coisas que eu queria fazer escrevendo. E isso apesar de eu estar parcialmente satisfeito, apesar de achar o que faço esteticamente bom.

Então, trago na minha centésima síntese do ócio e do tédio que cercam minha vida, más notícias. Daqui, hoje, não sairá nada genial, e se puderem, vão checar o que acontecerá nos próximos capítulos de qualquer novela porque será mais útil. Aliás, se minha vida tivesse sido até agora um acompanhamento de novelas, eu teria mais assuntos normais que contar nas conversas. Se minha vida tivesse sido um constante virar de páginas das revistas, dos jornais, e dos portais virtuais, teria mais material para minha vida.

Acontece, que como não faço nada disso, tenho que inventar tudo. Não que eu faça poucas atividades na minha vida, faço muitas, mas se eu não as enfeitasse do jeito que melhor me parece, seria uma lástima sem igual aos que me ouvem, e a mim próprio, que vivo dos meus delírios de grandeza, ou de nobreza, de beleza.

E essa vontade, vontade que eu diria ser uma vontade de não fazer feio na vida, que me fez ao tentar maquiar uma realidade sem graça e mesquinha, com alguns poemas de amor, alguns diálogos que nunca existiram, algumas esperanças mal-construídas, alguns
quixotismos e dulcinealizações (peguei pesado com a língua), rapidamente desmascarados, terminar por começar este blog e concluir hoje o seu centésimo post.

Fico contente, pois o objetivo era nunca abandoná-lo, e de certo modo o consegui até agora, talvez mais por necessidade do que por esforço.

Saturday, March 31, 2007

Ao meu lado

Quando sentas ao meu lado
Olho-te sentada sorrindo ao meu lado
Singularmente inexplicável, tu
Que onda me inunda, desnuda
Levanta, amansa e expulsa
Que fogo arde, consome
Mas que é onda, e de novo fogo, e tanto

Tu ausência, Tu cuidado
Tu mãos dadas, Tu agrado
Tu sozinha, Tu rosinha
Tu mansinha, ao meu lado

E eu me derreto como o diabo
Eu, inviolavelmente apaixonado
Amo como quem precisa de miopia
Vasto, triste, de antes abandonado

Quero-te junto com mais nada
A dormir linda ao meu lado
A sentar comigo na ceia
A olhar-me olhos de fada
A acender-me branca candeia

Mas permaneço em todo aflito
O futuro talvez não atente
Pra que fiques ao meu lado
Parvoíce minha dos descrentes
Realismo duro dos soldados

Mil fogos de artifício acionados!
Esperança eterna toma a frente!
Os tolos se viram humilhados
E a minha alma descontente

No final tornei-me insistente
Força que há muito não tinha
Que o amor faz o corpo mais quente
E a mente da sorte rainha
Se tu ainda tens duvidado
Do que tua boca provoca na minha
Vem e continua ao meu lado
Pois nenhum sol, nenhum malgrado
Entrará nessa nossa casinha

Saturday, March 24, 2007

Alterações

Por sua causa, hoje ouço rádio diferentemente,
Presto atenção em cada palavra,
Pois antes achava dispensável prestar atenção nelas,
Já que cansava-me menos.
Mas hoje dou outro sentido,
E descubri que oito em cada dez canções
São de amor
São de um amor rasgado, chorado na calçada,
O que justifica o mau gosto musical

Por sua causa, estou mais suscetível aos acidentes de trânsito,
E quase sofri alguns, por sorte quase,
Enquanto ficava matutando você,
Pois nada demanda mais que lembrar de ti
E lembrar, de certo modo é viver de novo,
Só que com medo e dor,
Sem esquecer, porém, que é viver, ainda,

Por sua causa, tornei-me por vezes eufórico,
Sem qualquer motivo ou explicação

Por sua causa, passei a praguejar o tempo,
Pois ele tem demorado a passar, tedioso.
E não falo do tempo que fico parado no trânsito,
Ou do tempo que demoram os programas de rádio.
Praguejo outro tipo de tempo,
E eu espero, quase sem forças,
Aquilo que não sei se devo esperar,
Aliás, que sei que não deveria esperar,
E por isso odeio os relógios e os calendários,

Mas não tem conserto, eu não tenho mais jeito,
Eu antes preferia era não sentir nada, apenas flutuar no espaço,
E apenas fazer o que a vida me designasse.
Perdi, no entantom também essa vontade, e lentamente fui tolhido,

Por sua causa, essas gotas de chuva
formam um espelho em que me vejo
Ouço barulhos de meu inconsciente
Que gritam, maus olhados, desejos

Mas digo que apesar de tudo,
Meus dias, em si,
Têm continuado sempre iguais



(o poema não está pronto nem acho que esteja bom o suficiente, então não é nada definitivo, mas coloco aqui já)

Wednesday, March 21, 2007

Sabedoria dos Outros

Estando eu algum tempo sem dormir, creio que minhas virtudes cerebrais vão se esvaindo.
Logo darei espaço a quem sabe mais. Duas coisas. O primeiro trecho é o poema famosíssimo de Augusto dos Anjos, "versos íntimos", que embora retratem aquele momento realmente ínitmo em que nós descremos do homem por completo, (camões até tem versos sobre isso, chama-se "ao desconcerto do mundo" deve haver alguma permanência desse sentimento ao longo da história. O outro trecho de Norberto Bobbio, capta muito bem a figura de Kant, quando se põe a falar da evolução moral do homem, creio que na metafísica dos costumes. Seria uma possível resposta kantiana a essa nossa postura descrente frente ao, parafraseando Camões, desconcerto do mundo e dos homens?

Cabe colocar os dois trechos um após o outro para dar um efeito. Como se pode ver, os versos de augusto dos anjos reportam para uma dimensão individual, (por isso particular), mas por vezes essas noções migram para o plano da atuação política, e ao sentido que damos à história, que é mais o objeto do trecho de Bobbio escolhido por mim. Um dia vou brincar com esse poema do augusto dos anjos. Ando concordando demais com ele, mas apenas no plano particular, felizmente:

Vês! Ninguém assistiu ao formidável
Enterro de tua última quimera.
Somente a Ingratidão - esta pantera -
Foi tua companheira inseparável!

Acostuma-te à lama que te espera!
O Homem, que, nesta terra miserável,
Mora, entre feras, sente inevitável
Necessidade de também ser fera.

Toma um fósforo. Acende teu cigarro!
O beijo, amigo, é a véspera do escarro,
A mão que afaga é a mesma que apedreja.

Se a alguém causa inda pena a tua chaga,
Apedreja essa mão vil que te afaga,
Escarra nessa boca que te beija!

E Bobbio, Kant:

"Comecei com Kant. Concluo com Kant. O progresso, para ele, não era necessário. Era apenas possível. Ele criticava os "políticos" por não terem confiança na virtude e na força da motivação moral, bem como por viverem repetindo que "o mundo foi sempre assim como vemos hoje". Kant comentava que, com essa atitude, tais "políticos" faziam com que o objeto de sua previsão - ou seja, a imobilidade e a monótona repetitividade da história - se realizasse efetivamente. Desse modo, retardavam propositalmente os meios que poderiam assegurar o progresso para melhor.
Com relação às grandes aspirações dos homens de boa vontade, já estamos demasiadamente atrasados. busquemos não aumentar esse atraso com nossa incredulidade, com nossa indolência, com nosso ceticismo. Não temos muito tempo a perder"

Friday, March 16, 2007

Sobre mim

A minha vida é feita ao estilo de uma comédia, mas teimam em querer transformá-la num suplício. Eu nunca, nem nos dias mais dramáticos da minha existência, perdi um pingo da salutar risada, de como quem vê o mundo com uma incompreensão cômica, e ao mesmo tempo já viu de tudo, sem ter visto, na verdade.
Eu fico triste, obviamente que fico, é só darmos uma olhada aí nos meus últimos posts, nas últimas coisas que escrevi, aliás, eu deveria parar com este hábito de usar esse blog como um diário. Mas embora triste, continuei a me flagrar rindo sozinho às vezes, continuei a usar um óculos ridículo para dirigir, na esperança de que alguém me veja e possa achar engraçado.
-------

Se sou ingênuo, isso se deve a minha educação católica. Se me mantenho fiel a principios de qualquer ordem, também. Entretanto, eu tenho uma visão muito prática sobre eles. Respeitar princípios éticos rígidos é muito prático. Evita-se dor de consciência e ainda tem-se milênios da humanidade e uma porrada de filósofos backing me up, para usar um anglicismo. Se sou assim, não é porque ainda não fui contaminado pela malícia do mundo e um dia hei de aprender, mas porque vejo que o mundo é muito ineficiente desse ponto de vista, de ter que inventar a roda todos os dias.
O amor, coloco-o como algo central na minha vida. Desta vez não por praticidade, mas por pragmatismo. Posso idealizá-los nas palavras, nos poemas, mas sabendo eu que ninguém é feliz sozinho (wave), e que sem amor não somos nada (Coríntios 13), sempre que tenho de escolher entre o amor e qualquer outra coisa, escolho o amor, lógico, eu não sou bobo nem nada.
Os anti-romanticos que me desculpem, mas ninguém dessacraliza mais o amor do que eu. O amor é que nem pastel de feira, é trivial minha gente, é estar parado no trânsito e ter esses insights sobre como você ama os outros.

Tuesday, March 13, 2007

sem título

Toda angústia cabe em mim
Minha alma é um ferro velho
Uma planta feia em meu jardim
Tem morrido todos os dias

A mesma planta, sempre mesquinha
Já que só tenho uma maldita planta em meu jardim
Feia, erva-daninha

Mas assim que as marteladas
Dos homens da construção civil
Acordam-me raivoso, furioso de viver
Vou a janela ver esmorecer minha planta

Fico triste.

Pois significa a tua ausência

Mas quando saio a caminhar na rua
E o mesmo barulho, talvez mais alto
Faz-me musical, contente com os outros
Vejo-a de longe rejuvenescida, embora feia

Mas que acontece, que aquele ser renasce
Sempre, insistente, sem eu ver?

É a tua volta
Que como o dia,
A vida e a morte sentencia
Em tudo que é meu


(encheram o saco tantos posts sobre amor, hehe, mas são os que tenho no momento, os de outros assuntos merecem muitos ajustes)

Sunday, March 11, 2007

Orestes Barbosa

Arranha-Céu

Cansei de esperar por ela
Toda noite na janela
Vendo a
cidade a luzir

Nestes delírios nervosos
Dos
anúncios luminosos
Que são a vida a luzir

E cada
vez que subia
O elevador não trazia
Essa mulher,
maldição

E quando lembro
Gemia o elevador e
descia
Fundia o meu coração

Cansei de olhar as
reclames
E disse ao peito não ame
Que o teu amor não te
quer

Descansa, feche a vidraça
Esquece aquela
desgraça
Esquece aquela mulher

Deitei então sobre o
peito
Vieste em sonho ao meu leito
E eu acordei que
aflição

Pensando que te abraçava
Alucinado
apertava
Eu mesmo meu coração

Saturday, March 10, 2007

A redução da TR.

Às vezes é bom falar de pequenos detalhes que mostram qual o direcionamento da nossa política econômica.

O governo decidiu mais uma vez em favor dos bancos. O aumento do redutor na taxa referencial (TR) quer dizer que todo mundo que tem poupança passará a ganhar menos em rendimentos. Vale lembrar que também todos os trabalhadores serão prejudicados, já que o FGTS (fundo de garantia por tempo de serviço) também é corrigido pela TR.
Havia um medo de que com a diminuição dos juros a poupança passase a competir com outras oportunidades de investimento, mais lucrativas para eles.

Significa dizer que os bancos tinham um problema de mercado decorrido da redução dos juros, e que o governo não tinha nada a ver com isso. Os bancos teriam que melhorar suas taxas de administração, que são bastantes altas. Por que será que o governo tomou as dores das instituições bancárias?

Agora com a poupança sendo menos rentável, as outras alternativas de investimento mais lucrativas aos bancos continuam sendo preferidas, e não há pressão para a diminuição das taxas de administração. O preço é pago por quem investe na poupança e por quem trabalha.

Ora, é salutar como alguns orgãos de imprensa e o governo tomaram a questão. A único benefício social desta redução é que quem faz financiamento para a casa própria (as prestações são corrigidas pela TR), pagará menos. Alguém poderia dizer que é um bom sinal, que o governo está ajudando as pessoas, como disse Lula. Mas duas observações devem ser feitas:

O universo prejudicado é muito maior do que a soma daqueles que dependem de um financiamento da casa própria. E além do mais, se o FGTS, que também é usado para financiar políticas públicas habitacionais, terá menor rendimento, então na soma social o saldo é negativo também para a habitação.

É lamentável que um governo apresente tamanho servilismo diante de certas questões. O Interfere então em questões de mercado para salvar o único setor que talvez não apresente problema nenhum de sustentabilidade.

Saturday, March 03, 2007

Infelicidade

Sempre tive a idéia de que a infelicidade seria um estado absoluto. Se se está infeliz, a alma está de tal forma envolvida na mágoa, que não se pode fazer mais nada. Não é assim. Enganei-me. A infelicidade convive conosco. É como uma deficiência. É como eu, que tenho que conviver com minhas incapacidades. É um demônio feio que nos assombra.
Por isso antes fosse nossa infelicidade absoluta, antes eu fosse um pianista frustrado e apenas isso. Valeria-me mais tragicidade.
Acontece que, além desse mundo estúpido, que nos diz não, há de ter algo que nos exija nobreza (no cume calmo do meu olho que vê assenta a sombra sonora de um disco voador). Quantas batalhas, quantos amores ainda terei que perder? Eu, que não sei quanta dor sou capaz de suportar.

Somos infelizes enquanto somos felizes, nada é pior do que ser infeliz e feliz ao mesmo tempo.

De que vale a poesia e o caráter, num mundo estúpido, feito por pessoas estúpidas? Farei-me esta pergunta a vida inteira.

Friday, March 02, 2007

O tempo do Brasil

Um amigo diz que só agora, finalmente, o resto do mundo chegou na fase das mulatas rebolando, algo que temos há mais de dois séculos. O que se vê nos canais de música, nas paradas de rádio?
O exemplo das mulatas é muito emblemático. O mundo ocidental entrou num intenso processo de catching up tendo como referência infalível o Brasil.
Os exemplos pululam a nossa frente. Mas, embora sirvam para efeitos retóricos, não são de todo conclusivos:
Nos últimos anos, o mundo enfrentou um aumento das desigualdades e das tensões econômico-sociais. (Estivemos sempre na frente). Também a Europa, que abriu seus portões aos imigrantes das mais variadas nacionalidades, prova pela primeira vez o sabor de um racismo explícito e velado, encardido, meio nojento, meio abominavelmente tolerável. Aplica, em suas políticas públicas, os mais sujos princípios de segregação espacial e cultural.
Devemos nos inflar de entusiasmo patriótico, pois, também o mundo infestou-se de consultores a dizer que “se algumas reformas forem feitas”, determinado país encontrará seu rumo. Povoou-se, então, de sujeitos categoricamente insuportáveis, que trabalham em organizações internacionais e graduaram na “Escola Superior da Falácia e da Diletância” de José Carlos Fernandes. E ainda se lê no jornal que as filas e o trânsito chegaram, enfim, a ter proporções paulistanas.
Seria um exagero dizer que o mundo está-se “subdesenvolvendo”, seria exagero dizer o contrário. A história não parece ser nada além de uma luta bastante incerta entre essas duas forças e, modéstia à parte, nenhum país expressa melhor esse conflito do que aquele cuja brisa beija e balança o auriverde pendão da minha terra.
Não é nenhum orgulho inspirar. Mas, nós, que conhecemos tantos nossos problemas a ponto de sermos capazes de ignorá-los, bem que poderíamos dar-lhes alguma luz. Ainda que sejamos acostumados a falar mal do Brasil, a característica de um patriotismo legítimo, temos de reconhecer que ao menos tentamos constantemente decifrar esse país ininteligível, e até tivemos certo sucesso. Orgulhemo-nos.
Orgulhemo-nos de nunca termos sidos catequizados, nas palavras de Oswald de Andrade, e ainda assim, não termos mergulhado na barbárie. Civilização sem catequização, eis o que temos a ensinar ao mundo.
Entretanto, e abandonemos a atmosfera rósea, o ano de 2007 é marcado, entre outras coisas, pelo segundo mandato de Lula. Estamos a esperar os resultados “pacote de crescimento” anunciado pelo governo. Vale perguntar se pacote de crescimento é capaz de melhorar substancialmente a economia de um país. O ano de 2007 é marcado pela continuidade de um caos nos aeroportos que esteve passando, dia a dia no noticiário, e, provavelmente, 90% da população não usa nenhum meio de transporte aéreo. As novelas continuam a misturar merchandising infame e fora de contexto com cenas de prática de tai chi chuan; a revista Veja continua a publicar alguns absurdos, como no dia em que aproximou a democracia direta ao regime nazista.
Em outras palavras, não só o mundo está virando Brasil, mas o Brasil , que já era Brasil, está como esteve sempre: na corda bamba.
A espera de que o nosso país sofra alguma melhora (e não uso o verbo sofrer à toa) é como uma promessa de ano novo coletiva, renovada anualmente. Como as senhoras que, entre uma garfada e outra na maionese, prometem começar uma dieta assim que o ano virar. “É só ter força de vontade”, dizem empanturradas. Por essa razão, se uma coisa nos distingue dos que nos copiam é o caráter de nosso otimismo. É substancialmente diferente. Otimismo costuma ser uma expectativa. Para nós, é uma promessa aflita, quase engasgada, uma resposta trágica a nossa impotência, pois sabemos nosso destino, em verdade. É a marca de uma nobreza heróica, que o mundo não enxerga.
Se todos caminhamos para o mesmo abismo de incerteza e selva, não é culpa nossa. E não chegaremos nunca a ensinar o mundo. Mas, bastará apenas que nos confiram certa poesia. Esse é mesmo o tempo do Brasil.

Tuesday, February 27, 2007

O que devemos superar.

Devemos superar as palavras. Devemos superar os conceitos, os constructos.
A palavra é algo grande, algo nobre, mas é um instrumento. Deve ser vista como um instrumento, portanto, a palavra é surda. Ela é suprasensível.
Os conceitos são igualmente representações da nossa realidade.
Interessa, pois, que vivamos além deles.

Não quero que eles deixem de existir. Mas que as pessoas reconheçam esta separação.

Monday, February 19, 2007

O MONOPÓLIO DE TV A CABO NOS EUA E O “CHOICE ACT”

Reproduzo, um "artigo" que expus na aula de microeconomia, primeiro semestre de 2006. O artigo não tem nada de especial, era um pequeno trabalho. Mas analiso uma lei proposta por um senador que provavelmente, aposto quando quiserem, será o próximo presidente dos EUA.

1 – Introdução
Este artigo busca esclarecer o comportamento monopolista das empresas de TV a cabo nos EUA à luz de um debate recente no congresso americano relativo ao “The Consumers Having Options in Cable Entertainment Act” ou apenas “Choice Act” (2006). Essa lei, proposta pelo Senador John McCain, do Arizona, visa oferecer aos consumidores a possibilidade de escolha “à la carte”, ou por pequenos pacotes de canais, na programação de TV a cabo, resultando além de uma queda nos preços de assinatura, numa defesa dos direitos dos consumidores de, afinal, poderem pagar apenas pelos canais que desejam realmente assistir.
Este breve estudo é produto de um trabalho proposto aos alunos do curso de Microeconomia II para a partir de um artigo de jornal desenvolver-se uma análise teórica baseada nos ensinamentos do curso. A escolha da notícia foi baseada nos seguintes critérios: em primeiro lugar, ela teria de possuir alguma descrição empírica de um fato econômico, exigência já existente na proposição do trabalho. O segundo era o de ela tratar de alguma proposta de aperfeiçoamento de um sistema. Com isso, não só é possível colocarmos à prova os modelos estudados para os validarmos quanto a sua consistência lógica e aplicabilidade no mundo real, como também reconhecermos como um dever o do economista de utilizar esses modelos para levar a sociedade a um estado de eficiência, sem que se percam, no entanto, os princípios éticos e humanos sem os quais a organização social, que nos permite o livre uso da razão, jamais existiria.
A leitura da notícia provoca à primeira vista algumas dúvidas, e é a elas que vamos nos ater para desenvolvermos as linhas de raciocínio presentes no trabalho. Nos primeiros parágrafos da notícia afirma-se que os consumidores norte-americanos não podem escolher a programação de TV a cabo na forma de pacotes, ou “à la carte”, canal por canal. A razão atribuída pelo autor é a falta de concorrência decorrente da estrutura de monopólio no serviço de TV a cabo, e o excesso de regulamentação governamental. Um leitor atento irá se perguntar: Sendo a disponibilização de pacotes de canais diferentes para venda a grupos específicos (ex: famílias com crianças pequenas, aposentados, estudantes de uma república) com diferentes preços uma forma de discriminação de preços de terceiro grau, uma estratégia típica do comportamento monopolista, como podem os monopólios de TV a cabo não desejarem disponibilizar esse serviços, já que isso representaria uma melhora no que tange à maximização dos lucros da firma, e que seja necessária uma lei de incentivo para condicioná-los a esse comportamento?
Depois, como essa lei pode ignorar um aspecto da teoria econômica ao querer além de incentivar a venda por pacotes ou “a la carte”, que ocorra a entrada de mais firmas nos mercados (dando obviamente mais opções de escolha ao consumidor e menores preços), se segundo a maior parte dos manuais de microeconomia, inclusive o adotado em nossa faculdade, o serviço de TV a cabo envolve custos fixos muito grandes, constituindo-se, pois, em um monopólio natural?
Bem, inicialmente, cabe explicar melhor no que consiste o Choice Act e quais seus fundamentos principais (a). Seguimos para a questão do monopólio natural (b), e ao fim tentaremos dar explicação à aparente contradição da primeira pergunta (c).

(a) “CHOICE ACT”
Na declaração do Senador McCain ao congresso há uma explicação bastante simples de quais os pilares dessa lei e a quem ela visa atingir. Podemos dizer que essa lei é particularmente uma lei de incentivo, que não obriga nenhuma firma a disponibilizar os pacotes, mas que fornece vantagens para quem quiser fazê-lo. Os incentivos são de ordem econômica: em resumo, a prestadora de serviços de TV a cabo que desenvolver pacotes, ou a escolha à la carte, terá a redução nas taxas pela utilização de instalações em terreno público (municipalidades), e poderão atuar na forma de “National Franchise”, ampliando consideravelmente o mercado de atuação, inclusive para transmissão via satélite e Internet, podendo eventualmente beneficiarem-se da regra de não-duplicação de conteúdo que dá exclusividade à transmissão de alguns canais.

(b) O Monopólio Natural
Empresas com grandes custos fixos e custos variáveis pequenos, normalmente fornecem sozinhas, em uma determinada localidade, um bem ou serviço porque não seria possível igualar o preço ao custo marginal devido aos grandes investimentos necessários para se criar uma estrutura de transmissão, integrada. É o caso das empresas distribuidoras de gás, empresas telefônicas, por exemplo. São reguladas pelo governo ou são estatais. È bem lógico aproximarmos os serviços de TV a cabo a uma situação de monopólio natural, pois as características são parecidas. Entretanto, não é em todo lugar que esses monopólios são observados. Em outros países, embora o mercado seja concentrado, é comum vermos duas ou três firmas atuando num mesmo mercado de TV a cabo. No Brasil, por exemplo, observa-se uma espécie de duopólio. Logo, cabe darmos uma explicação a esse fenômeno: há uns 20, 30 anos, era impossível que mais de um empresa estivesse disponibilizando serviços de TV a cabo numa cidade, pois não havia tecnologia de informação e transmissão que não necessitasse de custos fixos astronômicos. Com o avanço da fronteira tecnológica (escala mínima de eficiência) e com o crescimento da demanda, a estrutura do mercado pôde ficar menos concentrada que antes.
É claramente observável a diminuição relativa dos custos fixos (por exemplo, gastos com pessoal). Toda a estrutura de manutenção hoje é feita eletronicamente e a necessidade de instalações físicas também diminuiu devido à tecnologia. Acompanha isso a própria necessidade das empresas de se tornarem flexíveis, criando redes de cooperação com as produtoras de conteúdo. Tecnologia e maior eficiência organizacional possibilita a uma empresa de TV a cabo competir com outras sem que isso resulte em grandes prejuízos. Entretanto, se a competição é boa, para empresa o monopólio é muito melhor, ainda mais quando a regulação do governo favorece essa estrutura. Por isso que eles ainda existem embora haja tendência para desconcentração.
O aumento na demanda é também observável, em vista da importância da cultura do entretenimento na segunda metade do século XX. Cada vez mais os homens se transformam em consumidores de imagens, e o número de assinantes de TV cabo (e suas variantes) aumenta a cada ano. Também houve diminuição de custos, o que possibilitou a entrada de novos consumidores no mercado.
A lei, portanto, não ignora a teoria econômica, ela está em consonância com as mudanças na estrutura produtiva e de serviços.

(c) Discriminação de Preços: Venda de Pacotes X Venda Casada
Os consumidores americanos, se compram o serviço de TV a cabo recebem com eles os canais que gostam e os que não gostam. Um aposentado tem a MTV, e uma família com quatro crianças tem uma programação imprópria para crianças. Esse é o comportamento monopolista vigente no caso estudado e é conhecido como Vinculação de Produtos, ou Venda Casada. Por que eles optam por essa estratégia, e não por aquela que seria mais adequada do ponto de vista do consumidor, e, por que não, da sociedade (já que é uma lei que tenta incentivar esse comportamento)? A explicação poderia ser: Porque o lucro deles geralmente é maior usando essa estratégia. Um serviço de TV a cabo pode custar U$80,00, enquanto que se fosse separado em pacotes, o consumidor pagaria quase um terço desse valor. No entanto, é um equívoco atribuirmos essa explicação, pois a discriminação de preços tende a aumentar o lucro do monopolista, é uma melhora de Pareto, e não poderíamos, com os dados que temos a disposição, inferir se realmente haveria menor lucro.
A explicação mais consistente está no discurso do Senador McCain ao Congresso, e que passa invisível pela notícia. Ele diz: “Os consumidores continuam a subsidiar os custos de produção de canais que não assistem”. E conta uma conversa que teve com na diretoria de uma dessas empresas de TV a cabo, em que diziam que quando foi tentado tirar uns canais de vídeo clipes da grade de programação para colocar outro mais barato e preferível ao perfil dos consumidores, houve represália por parte do canal, que ameaçou fortes repercussões se seu canal fosse retirado.
Há então pressão por parte das produtoras de conteúdo para que não se discrimine preço pois isso traria perdas consideráveis ao seu negócio. Sem esses consumidores, que pagam sem querer por aquele canal, provavelmente ele não iria operar no mercado. Como a indústria do entretenimento é organizada na maior parte das vezes numa cadeia entre produção e distribuição, romper este contrato poderia prejudicar demais a empresa de TV a cabo, que não teria incentivos suficientes para comportar-se desta forma.
Conclusão
A grande virtude do Choice Act é a criação de uma estrutura de incentivos que possa levar as empresas de TV a cabo a acharem mais vantajoso a venda de pacotes, (mesmo que isso possa resultar em divergência com o interesse dos canais) do que a venda casada, na forma como ela é praticada. Se os incentivos forem corretos, e parece que são, é provável que a situação dos consumidores em geral melhore, abrindo caminho para o melhor aproveitamento das inovações na área de telecomunicações, como a TV digital e outros assuntos em pauta hoje em dia.

Friday, February 16, 2007

Video mais Esperado




Finalmente disponibilizaram esse video, absoultamente genial, em que Leonel Brizola prova mais uma vez porque foi e sempre será o maior político deste país.

Wednesday, February 14, 2007

Soul Brothers



Agradecimentos ao Renato por ter me mostrado esse vídeo maravilhoso.

Tuesday, February 13, 2007

Thursday, February 08, 2007

Elogio à Ciência (ou ascetismo Neo Panglossiano)

Na revista científica “Klaxon Scientific”
saiu um artigo em que Carl Jameson anuncia
a descoberta reveladora de todo um milênio,
de que o amor é visível, que fica
guardado numa parte do coração
e de que é uma bolinha quase transparente
que flutua dentro das pessoas, como bolhas de sabão

Eu sempre acreditei na hipótese das bolinhas transparentes
O mundo será bem melhor quando as pessoas
Puderem injetar bolinhas pré-manufaturadas
Ou extraí-las de pessoas já mortas, e
Colocar nas pessoas que precisam ter mais amor,
Nas que precisam se apaixonar mais.
Não há porque se proibir algo assim,
A ciência é o sol direto do meio dia
Tudo estará resolvido. Todo mundo viverá melhor.

Um caminhão atropelou hoje às 18 horas,
Hora do rush, o cientista Carl Jameson
E um satélite inativo soviético
Caiu em cima de seu laboratório, destruindo 20 anos de pesquisa,
Esmagando todos os seus estagiários inúteis

A sua mulher numa entrevista a rede de tv disse que ele deveria ter
Visto as bolhas de sabão que seu filho fazia,
enquanto tropeçava na areia densa do parque
enquanto marcava seus pés pequenos nela
e que os caminhões e os satélites
não deveriam ter sido nunca inventados

A morte de Carl Jameson não foi em vão
Aquela fatalidade improvável estava prevista nos estudos de física moderna
Haverá o dia em que poderemos controlar tudo
Até mesmo os motoristas sonolentos,
Até mesmo a trajetória dos satélites inativos

Tuesday, February 06, 2007

O mundo sem mim

No dia em que eu tiver vontade de me matar
Fecharei os olhos e apertarei bem a mão uma na outra
direi a mim mesmo “como foste idiota, ridículo”
“tua vida não merece nem terminar tão tragicamente”
e então esperarei a vontade passar

sem mim, o sol ainda brilha
por isso nunca vou me matar

Sunday, February 04, 2007

expectativa, desejo e promessa;

Tenho uma teoria que diz que para o brasileiro, expectativa, desejo e promessa se confundem. São uma coisa só.

Quer dizer que sempre quando emitimos uma opinião sobre como será o futuro, estamos dizendo ao mesmo tempo: eu espero que seja assim, eu desejo que seja assim, eu prometo que assim será.

É ilustrativo de nossa personalidade megalomaníaca. Quando algo não sai como esperado, nos sentimos tristes como se fossemos responsáveis pelo futuro. Mas não responsáveis individualmente, porque não faz o menor sentido pensar dessa maneira (e os americanos assim o fazem), responsáveis como um povo. Ao dizermos "eu prometo", somos porta-vozes.

Somos uma população de 188 milhões de tarólogos em serviço. O tarólogo fala pelo seu chefe, pelo seu cachorro, pela sua ex-namorada.

Ainda não perdemos o costume que outros povos já perderam de falar em nome de todos. Dizem-nos: "mas você não mora na favela, como sabe o que os moradores da favela pensam?", "você não está na política, como sabe o que os políticos pensam?", "você não é fã de calypso...", "você não assiste TV a tarde..." e por aí vai.

Talvez seja a hora de pararmos com as leviandades sobre o futuro, sobre nós, é bastante desonesto.
E eu ironicamente venho propor isso apoiado numa teoria absolutamente generalizante sobre o povo brasileiro.

Sunday, January 28, 2007

O teste. (rascunho)

Ela olhando-o com os olhos semicerrados afirmou uma pergunta que para ela parecia decisiva.
Disse:
- Talvez num outro contexto nada disso teria acontecido entre agente.

Ele ouviu fazendo força para não concordar. Nada jamais poderia acontecer num outro contexto. Os outros contextos não existem, e não existindo, tampouco pode existir qualquer coisa inserida nele. É lógico. Não é que nada teria acontecido num outro contexto, a verdade é que nem o nada poderia acontecer ali. Deixemos os outros contextos nos outros mundos, nas outras dimensões.

Mas prosseguira com seu raciocínio, pensava porque as pessoas se preocupavam com o que não existia, com os malditos contextos, com as escolhas que não escolheram, com os lábios que vizinhos não se encontravam, com o seco adeus na porta da festa, em vez de se preocuparem com aquele próprio contexto em que estavam, seja por força do destino ou do acaso. E já que estavam lá, de frentes um pro outro, meio bêbados, meio frágeis, qual era o propósito daquela pergunta fácil? Continuava querendo concordar com ela.

E se concordasse e falasse que o seu sentimento por ela era algo condicionado pelas circunstâncias, e absoluto, puro é que não era? e se pedisse licença para ir ao banheiro, lavar o rosto? Ganharia tempo. Foi que nun instante percebera que estava sob um teste. A sua presunção de que naquele momento, nada que eles dissessem um ao outro faria algum sentido racional,lhe dera a dica de que olhando para ela, era a hora de dizer irracionalidades. E falou-a das mais sinceras e belas irracionalidades deste mundo:

- Não posso concordar com você, Clara. Não posso parar de pensar que se te visse passeando na rua como estranha, e que nunca tivesse a menor chance de conhecer-te, eu mesmo assim ainda iria te parar, ou que um acidente de carro não aconteceria bem na nossa frente, fazendo-nos socorrer juntos as vítimas do desastre. e se tu fosses uma pobre, e eu um rico, ou o contrário, ou se tu fosses uma chinesa, eu um mercador europeu, e se tu fosses uma flor e eu uma criança, eu teria a decência de me apaixonar por ti, e não digo que é destino, nem acaso, pois não se trata disso. Olhar-te e apaixonar-me por ti é cumprir um dever que tenho com a vida, e com o amor, e qualquer situação em que eu não fizesse isso, estaria sendo menos eu, e o mundo derramaria uma lágrima triste, desesperado mais uma vez por alguém não ter sido si mesmo.

Ela abriu os olhos e se aproximou, beijando-o delicadamente.