Um amigo diz que só agora, finalmente, o resto do mundo chegou na fase das mulatas rebolando, algo que temos há mais de dois séculos. O que se vê nos canais de música, nas paradas de rádio?
O exemplo das mulatas é muito emblemático. O mundo ocidental entrou num intenso processo de catching up tendo como referência infalível o Brasil.
Os exemplos pululam a nossa frente. Mas, embora sirvam para efeitos retóricos, não são de todo conclusivos:
Nos últimos anos, o mundo enfrentou um aumento das desigualdades e das tensões econômico-sociais. (Estivemos sempre na frente). Também a Europa, que abriu seus portões aos imigrantes das mais variadas nacionalidades, prova pela primeira vez o sabor de um racismo explícito e velado, encardido, meio nojento, meio abominavelmente tolerável. Aplica, em suas políticas públicas, os mais sujos princípios de segregação espacial e cultural.
Devemos nos inflar de entusiasmo patriótico, pois, também o mundo infestou-se de consultores a dizer que “se algumas reformas forem feitas”, determinado país encontrará seu rumo. Povoou-se, então, de sujeitos categoricamente insuportáveis, que trabalham em organizações internacionais e graduaram na “Escola Superior da Falácia e da Diletância” de José Carlos Fernandes. E ainda se lê no jornal que as filas e o trânsito chegaram, enfim, a ter proporções paulistanas.
Seria um exagero dizer que o mundo está-se “subdesenvolvendo”, seria exagero dizer o contrário. A história não parece ser nada além de uma luta bastante incerta entre essas duas forças e, modéstia à parte, nenhum país expressa melhor esse conflito do que aquele cuja brisa beija e balança o auriverde pendão da minha terra.
Não é nenhum orgulho inspirar. Mas, nós, que conhecemos tantos nossos problemas a ponto de sermos capazes de ignorá-los, bem que poderíamos dar-lhes alguma luz. Ainda que sejamos acostumados a falar mal do Brasil, a característica de um patriotismo legítimo, temos de reconhecer que ao menos tentamos constantemente decifrar esse país ininteligível, e até tivemos certo sucesso. Orgulhemo-nos.
Orgulhemo-nos de nunca termos sidos catequizados, nas palavras de Oswald de Andrade, e ainda assim, não termos mergulhado na barbárie. Civilização sem catequização, eis o que temos a ensinar ao mundo.
Entretanto, e abandonemos a atmosfera rósea, o ano de 2007 é marcado, entre outras coisas, pelo segundo mandato de Lula. Estamos a esperar os resultados “pacote de crescimento” anunciado pelo governo. Vale perguntar se pacote de crescimento é capaz de melhorar substancialmente a economia de um país. O ano de 2007 é marcado pela continuidade de um caos nos aeroportos que esteve passando, dia a dia no noticiário, e, provavelmente, 90% da população não usa nenhum meio de transporte aéreo. As novelas continuam a misturar merchandising infame e fora de contexto com cenas de prática de tai chi chuan; a revista Veja continua a publicar alguns absurdos, como no dia em que aproximou a democracia direta ao regime nazista.
Em outras palavras, não só o mundo está virando Brasil, mas o Brasil , que já era Brasil, está como esteve sempre: na corda bamba.
A espera de que o nosso país sofra alguma melhora (e não uso o verbo sofrer à toa) é como uma promessa de ano novo coletiva, renovada anualmente. Como as senhoras que, entre uma garfada e outra na maionese, prometem começar uma dieta assim que o ano virar. “É só ter força de vontade”, dizem empanturradas. Por essa razão, se uma coisa nos distingue dos que nos copiam é o caráter de nosso otimismo. É substancialmente diferente. Otimismo costuma ser uma expectativa. Para nós, é uma promessa aflita, quase engasgada, uma resposta trágica a nossa impotência, pois sabemos nosso destino, em verdade. É a marca de uma nobreza heróica, que o mundo não enxerga.
Se todos caminhamos para o mesmo abismo de incerteza e selva, não é culpa nossa. E não chegaremos nunca a ensinar o mundo. Mas, bastará apenas que nos confiram certa poesia. Esse é mesmo o tempo do Brasil.
Friday, March 02, 2007
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1 comment:
Adorei Diogo! Acho que é bem verdade tudo o que vc escreveu.
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